Índice Glicémico e Carga Glicémica

Numa crescente procura por estratégias eficazes de emagrecimento e controle de doenças crónicas, o entendimento dos conceitos de índice glicémico (IG), carga glicémica (CG) e índice insulínico (II) assume uma relevância indiscutível. Estes parâmetros, profundamente realacionados com o metabolismo dos hidratos de carbono, desempenham papéis cruciais na modulação da glicemia e da resposta insulínica, influenciando, a gestão do peso, a saúde metabólica e a longevidade.

O índice glicémico, é uma medida que reflete a rapidez com que os alimentos elevam a glicose no sangue, transformou a forma como percebemos os hidratos de carbono, desafiando a visão simplista de sua classificação como “simples” ou “complexos”.

Por sua vez, a carga glicémica, que considera tanto a qualidade quanto a quantidade de hidratos de carbono consumidos, oferece uma perspectiva mais detalhada sobre como os alimentos afetam a glicemia.

Já o índice insulínico, ainda que menos abordado, é fundamental para compreender como diferentes alimentos estimulam a secreção de insulina, hormona chave no armazenamento de gordura e na manutenção da homeostase da glicose.

Este artigo pretende explicar melhor as nuances desses conceitos, esclarecendo as diferenças e as inter-relações entre o IG, CG e II. No fim, espero ter fornecido insights valiosos que possam ajudar na escolha de estratégias alimentares personalizadas.

Conteúdo deste artigo

1 - Introdução

Apesar de serem parecidos e estarem relacionados, significam medidas ou referências diferentes.

2 - Índice Glicémico (IG)

O Índice Glicémico (IG) é um parâmetro crucial a levar em conta, especialmente quando consideramos o metabolismo dos hidratos de carbono e o seu impacto na glicémia.

Este índice mede a rapidez com que um alimento contendo hidratos de carbono eleva a glicose sanguínea após a sua ingestão.

Alimentos com um alto IG são rapidamente digeridos e absorvidos, resultando numa rápida elevação da glicemia e, por consequência, num aumento na secreção de insulina. Este mecanismo pode afetar diretamente o apetite, a saciedade e a fome, tendo implicações na gestão do peso e no controle de doenças metabólicas como a diabetes.

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O conceito de IG é muito relevante, mas não considera a quantidade total de hidratos de carbono presentes no alimento, mas sim a qualidade destes e a sua influência na glicémia. Isso significa que a escolha dos alimentos baseada apenas no IG pode ser simplista, ignorando outros aspectos nutricionais importantes, como o conteúdo de fibras, vitaminas, minerais e a densidade nutricional geral do alimento.

Alimentos com baixo IG são metabolizados mais lentamente, levando a uma libertação mais gradual de glicose na corrente sanguínea e, consequentemente, a uma resposta insulinémica mais atenuada. Esta característica é benéfica para a manutenção da saciedade por períodos mais prolongados e para o controle glicémico, aspectos fundamentais na gestão do peso e na prevenção de doenças crónicas.

A determinação do IG de um alimento é realizada em condições controladas, comparando a resposta glicémica que 50g de hidratos de carbono puros do alimento produzem, em relação à resposta glicémica induzida por um alimento-controle, geralmente a glicose ou o pão branco. Esta metodologia permite estabelecer uma escala comparativa, facilitando a escolha alimentar baseada nos efeitos metabólicos dos hidratos de carbono.

Mas o IG não é o único indicador de qualidade de um alimento. A complexidade nutricional dos alimentos, incluindo a presença de fibras, proteínas e gorduras, pode modificar significativamente os efeitos metabólicos previstos pelo IG isoladamente.

Por exemplo, a farinha de aveia possui um IG moderado a alto, dependendo da sua forma de processamento, mas é rica em fibras solúveis, proteínas, vitaminas e minerais, oferecendo uma densidade nutricional significativa. Este é um excelente exemplo de como um alimento não deve ser avaliado apenas pelo seu IG, mas sim por um contexto nutricional mais amplo, que considera a sua composição geral e os benefícios à saúde associados ao seu consumo regular.

Em resumo, o IG é uma ferramenta útil na orientação de escolhas alimentares, especialmente para indivíduos com necessidades específicas de controle glicémico. No entanto, deve ser utilizado em conjunto com outros parâmetros nutricionais, promovendo uma abordagem mais holística e equilibrada na avaliação da qualidade dos alimentos.

3 - Carga Glicémica (CG)

A Carga Glicémica (CG) é um conceito fundamental na nutrição, pois oferece uma perspectiva mais abrangente do impacto dos hidratos de carbono na glicemia. Este indicador avalia não só a qualidade do hidrato de carbono consumido, através do seu Índice Glicémico (IG), mas também a quantidade presente numa porção específica do alimento. Além disso, a CG incorpora o efeito da fibra alimentar na absorção da glicose, o que confere a este indicador uma relevância prática superior, especialmente para o planeamento de dietas e o controle metabólico.

A CG é particularmente útil por considerar a quantidade real de hidratos de carbono consumidos numa “porção normal” de alimento, proporcionando uma visão mais precisa do seu efeito potencial na glicémia. Assim, a CG revela-se mais prática e aplicável no dia a dia do que o IG, ao refletir o impacto real dos alimentos consumidos em quantidades habituais.

Um alimento com um IG elevado pode apresentar uma CG baixa se a porção consumida contiver uma pequena quantidade de hidratos de carbono efetivos. Vou ilustrar  este conceito com exemplos:

  • Considerando uma porção de 120g de banana, que contém aproximadamente 24g de hidratos de carbono, o seu IG é de 52 (considerado médio), resultando numa CG de 12 (também média).

  • Por outro lado, uma porção de 152g de melancia, contendo 10g de hidratos de carbono, tem um IG de 72 (alto). No entanto, a sua CG é apenas de 7,2 (baixa), refletindo a menor quantidade de hidratos de carbono disponíveis para absorção.

Este contraste entre banana e melancia destaca como a quantidade de hidratos de carbono num alimento pode alterar significativamente a sua carga glicémica, mesmo quando o IG permanece elevado.

Um exemplo ainda mais ilustrativo é o do abacate:

  • Em 100g de abacate, encontram-se cerca de 17g de hidratos de carbono. Contudo, devido ao seu elevado teor de fibras, o impacto na glicémia é minimizado. Após ajustar para o conteúdo de fibra, os hidratos de carbono líquidos num abacate reduzem-se para aproximadamente 3,65g, resultando numa CG inferior a 1.

Estes exemplos sublinham a importância de considerar ambos os conceitos, IG e CG, na avaliação do impacto dos alimentos na glicemia. A CG, ao levar em conta o conteúdo de fibra e a quantidade real de hidratos de carbono consumidos, fornece um indicador mais completo e útil para a gestão dietética, especialmente em contextos de controlo da diabetes e manutenção de um peso saudável.

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Este marcador mede o impacto glicémico da dieta, sendo calculado pelo produto do IG do alimento pela quantidade de hidratos de carbono, contida na porção consumida do alimento.

4 - Índice Insulinémico (II)

O Índice Insulinémico (II) é uma métrica que, diferentemente do Índice Glicémico (IG) ou da Carga Glicémica (CG), foca na resposta insulínica provocada pela ingestão de alimentos, independentemente dos níveis de açúcar no sangue.

Esta medida é particularmente relevante porque muitos alimentos, incluindo fontes de proteínas como carnes magras, podem desencadear um aumento nos níveis de insulina mesmo na ausência significativa de hidratos de carbono. Além disso, certos alimentos podem provocar uma resposta insulínica que não corresponde proporcionalmente à sua carga glicémica ou ao seu conteúdo de hidratos de carbono.

Um exemplo ilustrativo é a proteína whey isolada, que, apesar de ter um teor muito baixo ou inexistente de hidratos de carbono, pode induzir um aumento significativo nos níveis de insulina. Este efeito faz da whey uma escolha popular em contextos de perda de peso e nutrição desportiva, oferecendo um suporte eficaz para o crescimento e a recuperação muscular. Contudo, em situações de resistência à insulina, pode ser prudente considerar alternativas devido à sua potencial elevação insulínica.

Por outro lado, a caseína, que também fornece os nove aminoácidos essenciais, apresenta um Índice Insulinémico significativamente mais baixo em comparação com a whey. Este perfil torna a caseína uma opção mais adequada para indivíduos preocupados com a modulação da resposta insulínica, particularmente durante períodos de jejum prolongado ou para aqueles que buscam uma libertação mais lenta de aminoácidos.

A relevância do Índice Insulinémico transcende a simples consideração do IG ou CG, uma vez que fornece insights valiosos sobre como diferentes alimentos podem influenciar o metabolismo para além da glicémia.

Esta abordagem mais holística pode ser crucial na gestão de condições como a resistência à insulina, a diabetes tipo 2, e na otimização da composição corporal. 

5 - Fatores que alteram o índice glicémico

Apesar de ser possível atribuir um Índice Glicémico (IG) a cada alimento em suas diversas formas, existem vários fatores que influenciam a velocidade com que determinado alimento pode elevar a glicose no sangue, o que é particularmente importante para pessoas com diabetes e para aquelas que enfrentam questões de saúde relacionadas à resistência à insulina.

  • Maturidade: A maturação da fruta ou do vegetal tem um impacto direto no seu IG. Geralmente, quanto mais maduro o alimento, maior será o seu IG devido ao aumento do conteúdo de açúcares simples.

  • Processamento e Refinação: O processamento altera significativamente o IG de um alimento. Por exemplo, o sumo de fruta apresenta um IG mais elevado comparativamente à fruta inteira. Isso deve-se à remoção de fibras durante o processo de extração do sumo, facilitando assim uma rápida absorção de glicose. Da mesma forma, farinhas integrais possuem um IG inferior em relação às farinhas refinadas, uma vez que o teor de fibra mais elevado nas integrais retarda a digestão e absorção de carboidratos.

  • Método de Cozimento: A forma como um alimento é cozinhado também pode afetar o seu IG. Por exemplo, puré de batata tem um IG mais alto do que batatas cozidas inteiras, e massas cozidas al dente apresentam um IG mais baixo do que as que foram cozidas por períodos mais longos. Cenouras salteadas têm um IG muito inferior comparado ao de um creme de cenoura, devido à diferença na textura e estrutura.

  • Combinações Alimentares: A combinação de alimentos com alto IG com fontes de fibras, gorduras e outros componentes como o vinagre pode diminuir o impacto glicémico da refeição. Embora isso não modifique o IG intrínseco do alimento, afeta a resposta glicémica global.

  • Temperatura e Refrigeração: Alimentos ricos em amido, como arroz, batata e massas, tendem a apresentar um IG e CG mais baixos após serem refrigerados. Isso ocorre devido a alterações na estrutura molecular do amido, que se transforma em amido resistente. Este processo aumenta a quantidade de hidratos de carbono que resiste à digestão rápida, retardando assim a liberação de glicose na corrente sanguínea.

Por isso, também a escolha e o preparo dos alimentos devem ser feitos com atenção a esses aspectos, permitindo um melhor controle glicémico e contribuindo para a saúde metabólica.

6 - Conclusão

Espero ter deixado claro as diferencças entre o que é o Índice Glicémico (IG), a Carga Glicémica (CG) e o Índice Insulinémico (II), que são conceitos distintos que, embora relacionados, medem diferentes aspetos da interação entre os alimentos e o metabolismo, particularmente em relação à elevação dos níveis de glicose e insulina no sangue.

Para a generalidade das pessoas, a escolha de alimentos naturais e o respeito pelas porções recomendadas minimizam a necessidade de um controlo rigoroso destes índices.

No entanto, a adoção de uma dieta que privilegia alimentos com valores baixos de IG, CG e II pode trazer benefícios à saúde de todos, ajudando a evitar picos de glicémia e insulina, o que, por sua vez, pode contribuir para uma melhor gestão do peso e prevenção de doenças metabólicas.

Em contextos específicos, como na prática desportiva, alimentos com um IG elevado podem ser estrategicamente incorporados na dieta para otimizar o rendimento, fornecendo uma fonte rápida de energia.

No entanto, em situações de condições de saúde como diabetes, resistência à insulina e outras condições associadas — incluindo excesso de peso, síndrome do ovário policístico, deslipidémias, ácido úrico elevado e problemas renais —, torna-se crucial uma atenção mais detalhada a estes índices para uma gestão eficaz da saúde e prevenção de complicações.

Referências

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